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quinta-feira, julho 31, 2003

30. Eduardo Prado Coelho, num artigo do jornal O Público reflecte sobre o mundo dos blogues, num artigo intitulado Blogue Blogue.

Duas realidades têm emblematizado este Verão. Não me refiro aos habituais incêndios, que permitem sempre a qualquer oposição dizer que faria melhor do que qualquer Governo, nem ao segredo de justiça, nem ao caso da Universidade Moderna, nem à demissão do chefe do Estado-Maior do Exército, que, ao que parece, "perdeu a confiança" no ministro, nem à questão da duração da prisão preventiva ou da extensão das escutas telefónicas. Também não estou a pensar na incapacidade em se encontrar armas de destruição maciça no Iraque, no sofrimento aparentemente sem saída do exército americano ou nas dificuldades de Blair envolvido numa história sinistra. Falo, sim, de duas realidades mais modestas e contudo extremamente importantes: os blogues e o chá verde.

Qualquer delas aparece como um bom "tema" para reportagem nos jornais e revistas. Fiquemos hoje pelo blogue. Ele corresponde à criação de espaços na Internet onde uma pessoa ou um grupo de pessoas se sente autorizado a escrever sobre todos os assuntos que lhe interessarem. O formato dos textos é extremamente variável, podendo ir da simples frase assassina à longa deambulação evocativa, da citação oportuna à polémica mais militante. Alguns dos autores gostam de ser identificados, outros escolhem os enredos imaginários dos pseudónimos ou heterónimos, suscitando mesmo inquéritos quase policiais. É neste âmbito que de vez em quando um jornal ou um amigo suspeita de que eu seja autor de um blogue. Devem pensar que vivo numa dimensão temporal inacessível aos humanos... Diga-se de passagem que nem mesmo leio com regularidade os blogues dos outros. Não tenho tempo.

Toda a questão está no autor do blogue "sentir-se autorizado a". Outrora era complexa a malha das legitimações que nos permitiam ter acesso ao concorrido espaço mediático. Tínhamos de começar por tarefas modestas, agora uma recensão a um livrinho sem importância, agora um acontecimento musical, agora a reportagem de uma viagem às Maldivas. Pouco a pouco ia- se pondo à prova a capacidade de escrita, mas sobretudo mostrava-se que a nossa escrita podia ter leitores. Passávamos a uma colaboração regular e daí a uma presença assídua e responsável. O autor ia aos poucos estabelecendo um pacto de confiança com os leitores. Tinha reacções por carta ou mesmo na rua, recebia correspondência, influenciava as vendas dos livros ou discos, contribuía para encher as salas de cinema. O momento mais compensador tem a ver com o facto de nos atribuírem um glorioso papel justiceiro: o senhor, que escreve nos jornais, tem de escrever sobre esta escandaleira!

Os blogues passam por cima de tudo isto e entra-se de imediato nas matérias. Não é preciso articular muito bem os textos. Pode ser uma observação verrinosa, um comentário sardónico. Pode usar toda a agressividade que quiser, porque isso faz parte das regras do jogo. É possível que se esteja a formar uma nova forma de intervenção ou novos processos de produção e exposição do pensamento. É possível que seja um mero fenómeno de moda e que mais tarde possamos dizer: houve um verão em que só se falava em blogues, lembram-se? Mas é um facto que surgiu um novo dispositivo, uma nova maneira de participar na cena pública, um novo tom, uma outra energia. Para quem acredita que o lugar onde se escreve condiciona o que se pensa e escreve isto pode ser um verdadeiro acontecimento.

Autor: Eduardo Prado Coelho
Local: Imprensa - O Público
Data: 31 de Julho de 2003
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29. Socio[B]logue (que sendo um dos editores deste blogue não tem alguma responsabilidade neste post, cuja inclusão se prende apenas com a sua pertinência) analisa a prática metabloguista, através do conjunto de discursos recolhidos e já inseridos neste blogue, no texto Os Blogues e a Inconstância Atitudinal (act.)

Como já aqui fiz referência, foi recentemente criado um blogue, o Metablogue, destinado a ir registando e arquivando os textos e os debates sobre a blogosfera e o mundo dos blogues. (.../...) Uma das principais virtualidades da existência do Metablogue consiste na possibilidade de se analisar o metabloguismo, isto é, a possibilidade de se formar um discurso meta-meta-bloguista. Essa interessante potencialidade possui tantos atractivos apelativos, como levanta problemas desafiantes. Se, por um lado, permite analisar algumas das características dos esforços de pensar o mundo dos blogues, por outro lado, levanta o problema da circularidade do objecto, isto é, levanta a questão da auto-referencialidade de todos os discursos (o perigo do meta-meta-meta-bloguismo, dos discursos sobre os discursos sobre os discursos).

Apesar de consciente dessas questões e dos pertinentes problemas a elas associados, não pude deixar de fazer algumas reflexões meta-meta-bloguistas à medida a que ía recolhendo alguns trechos textuais para eventualmente integrar no Metablogue. Era, talvez, inevitável. Nesse processo, pude constatar, inadvertidamente, a recorrência de asserções avaliativas sobre a blogosfera, implícitas ou explícitas, no quadro desses discursos. Não resisti à pulsão analítica. Peguei então em alguns desses trechos textuais, provenientes de algumas das pessoas que mais produziram discursos metabloguistas (Avatares de Um Desejo; Aviz; Abrupto; Guerra e Pas; Socio[B]logue) e apliquei, ainda que de forma pouco controlada metodologicamente, um procedimento analítico de medida de atitudes: a EAA - Evaluative Assertion Analysis (Análise de Asserção Avaliativa). A EAA é um tipo particular de análise de conteúdo avaliativa, desenvolvida, originalmente, pelo psicólogo social C. E. Osgood, cujo propósito consiste na medição de atitudes (cf. Bardin, 1977; Krippendorf, 1980; Ghiglione e Blanchet, 1991). "Uma atitude", como sublinha Laurence Bardin, "é uma pré-disposição, relativamente estável e organizada, para reagir sob forma de opiniões (nível verbal), ou de actos (nível comportamenteal) em presença de objectos (pessoas, ideias, acontecimentos, coisas, etc.) de maneira determinada." (Bardin, 1977: 155). Neste caso tomei como objecto de atitude (elemento sobre o qual se debruça a avaliação) a blogosfera e anotei os termos avaliativos de significação comum sobre ela produzidos numa escala de Lickert (5 valores, dois positivos, dois negativos, um valor central neutro).

Embora seja necessário repetir a análise em condições mais controladas metodologicamente e com um corpus analítico mais consistente e abrangente, alguns resultados desta análise são interessantes (ainda que - frise-se - pouco conclusivos). O principal dado que me chama a atenção é o facto de existir, nestes blogues, uma grande inconstância e descontinuidade no que respeita às atitudes manifestas face à blogosfera. Isto é, existe uma grande oscilação entre valorações positivas e negativas da blogosfera no quadro dos discursos metabloguistas destes blogues: o Socio[B]logue e o Avatares de um Desejo, apesar de apresentarem alguma variabilidade, são os que menos oscilam; por outro lado o Aviz, o Abrupto e o Guerra e Pas são os que mais oscilam (embora com algumas diferenças: em termos médios as valorações do Abrupto são mais positivas e as do Guerra e Pas mais negativas). Se seria expectável a existência de alguma oscilação - afinal, a blogosfera vai mudando e, com ela, a percepção que dela se faz -, o que é mais interessante é que, em alguns casos, verifica-se uma oscilação assinalável com intervalos relativamente diminutos (dois dias). Essa informação, apesar de precária, leva-me a colocar algumas questões: Porquê a necessidade que sentimos de avaliar a blogosfera? A que se devem estas oscilações atitudinais? Como é que os sujeitos percepcionam essa inconstância atitudinal? São questões, parece-me, que importa explorar.

Bardin, Laurence (1977 [2000]), Análise de Conteúdo, Lisboa: Edições 70.
Krippendorf, Klaus (1980), Content Analysis. An Introduction to its Methodology, London: Sage.
Ghiglione, Rodolphe & Alain Blanchet (1991), Analyse de contenu et contenus d'analyses, Paris: Dunod.

Nota Adicional: Estes dados não são fiáveis devido a potenciais enviesamentos do corpus analítico (além do mais, normalmente são utilizados três codificadores para diminuir o problema da subjectividade da codificação das asserções avaliativas). Pretendo, por isso, repetir a experiência analítica, em breve com um pouco mais de fiabilidade. Porém, não se deve ver nestes dados mais do que aquilo que eles são: uma experiência.

Autor: João L. Nogueira
Local: Blogue - Socio[B]logue
Data: 29 de Julho de 2003


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quarta-feira, julho 30, 2003

28. Carla Hilário de Almeida (Bomba Inteligente), reflecte sobre a blogosfera a partir do conceito de «parrhesia» de Michel Foucault [texto].

Michel Foucault, em Fearless Speech, uma compilação de seis conferências em inglês dadas pelo filósofo na Universidade de Berkeley, analisa a importância da parrésia na Grécia Antiga. Parrésia, como Foucault bem explica, significa dizer tudo (pan = tudo + rima = verbo, ou melhor, aquilo que é dito). Foucault esclarece que, em inglês, parrhesia foi traduzido para free speech e que "(...) the parrhesiastes is someone who says everything he has in mind: he does not hide anything, but opens his heart and mind completely to other people through his discourse." Ou seja, o parresiatas é alguém que diz a verdade. A questão é depois aprofundada por Foucault, que liga a questão do exercício da verdade com a autoridade e o poder (coisas muito diferentes na altura e agora também). Segundo Foucault, a parrésia só era pertença dos corajosos, porque habitualmente eram homens (aparecem mulheres parresiastas em Eurípides) de condição social inferior (ou os anónimos da altura) que num momento certo diziam o que acreditavam ser verdade. E acreditar no que é a verdade significa saber o que é a verdade, coisa que para os gregos era a mesma coisa: "For the Greeks (...), the coincidence between belief and truth does not take place in a (mental) experience, but in a verbal activity, namely, parrhesia.

E o que tem o exercício da verdade a ver com a blogosfera? Tudo. Embora dizer a verdade na blogosfera não implique correr risco de vida (ainda). Este pormenor afasta-me da noção de parrésia defendida por Foucault, porque para haver parrésia de facto tem de haver um poder instituído, e na blogosfera isso não existe. A conjugação da verdade com a sinceridade é o que mais me interessa na blogosfera. E, já agora, na vida. Mas que não é para todos, lá isso não é.

Autor: Carla Hilário de Almeida
Local: Blogue - Bomba Inteligente
Data: 30 de Julho de 2003
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27. Outro, Eu, , no resclado de uma polémica com Dicionário do Diabo, traz-nos uma reflexão em que a blogosfera, junto dos já catalogados meios frios e meios quentes, surge como meio a ferver. Ou sem instância de arrefecimento.

Perigos
O J., um dos meus "grilos falantes", amigo praticamente tão antigo como a minha noção de amizade, diz-me que exagerei na dose, na primeira reacção à referência de Pedro Mexia à TSF. Quando escrevi que o comentário dele seria "risível" terei ido longe demais. Aceito a crítica, claro. O J., no entanto, vai mais longe (não confundir com "longe demais") e elabora sobre a questão. "Como a blogoesfera é um mundo sem mediação (ou seja, pensa-se e escreve-se, pronto, já está), digamos que não tem mecanismos de arrefecimento que costumam evitar atritos. O Pereira Coutinho foi aos arames (cá está: 'arames'... mais uma plavra perigosa quando escrita em vez de dita), por causa duma palavra ('extrema-direita'). Até a Bomba se passou com palavras inocentes ('espadeirada'): ou seja, é preciso algum cuidado (o registo certo, para mim, seria o do crítico de cinema João Lopes, que se mantém civilizado mesmo durante as polémicas). Se em vez de 'risivel' escrevesses a expressão 'não é verdade' já evitarias a peixeirada (cá está outra expressão perigosa, que assim, lida, parece dolosa). Quer dizer que a blogosfera põe as 'palavras escritas' num patamar até agora desconhecido: são acessíveis ao público, mas como se fossem ditas em privado... uma espécie de big brother das ideias, com tudo o que de picante e arriscado tem a coisa". Porque são grandes os perigos de escrever sem os tais 'mecanismos de arrefecimento' é que, pareceu-me depreender da opinião do J., é mais fácil, na blogosfera, perder a razão do que conquistá-la. "Comunicar bem significa contar com esse efeito de distorção à chegada (no receptor da mensagem) e no que ele implica ao elaborar a mensagem à partida (no emissor). Diria mesmo: se não contares com ele, falharás no teu intuito comunicacional (na mensagem que queres fazer passar)". Touché!"

Autor: Carlos Vaz Marques
Local: Blogue- Outro, Eu
Data: 29.07.03


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terça-feira, julho 29, 2003

26. Espigas ao Vento, no seu post Livro Aberto , levanta o problema da nossa ideia de Blogosfera poder estar, de certa forma, condicionada à dimensão da "Blogosfera" do Blogspot. E também deixa no ar uma interrogação: será que o aumento exponencial de blogs em países como o Irão, "são uma fuga à repressão?"

"LIVRO ABERTO (NTV) A tertúlia sobre weblogs no programa de Francisco José Viegas não trouxe nada de novo a nós, bloggers. Mas tal como outros eventos do género, na rádio ou nos jornais e revistas, deu mais um passo para a divulgação da blogosfera portuguesa para além desta "cápsula" de leitores-escritores. Falou-se das motivações de quem escreve, dos hábitos que vieram de algum modo "desestabilizar" a vida de cada uma destas pessoas, que dedica uma parte do seu tempo a escrever para uma página na internet.
Alguns dos convidados foram os mesmos de outras ocasiões, mas houve uma notória evolução. Foi extremamente interessante ver no pequeno ecrã a Cristina Fernandes , o Statler (que me pareceu pouco à vontade frente às câmaras), e o Bernardo Rodrigues, todos alvos diários do espigas nas suas navegações bloguísticas.
O Pedro Mexia voltou, na minha opinião, a cometer um erro. Enfatizou excessivamente o mundo bloguístico norte-americano, esquecendo os milhares no Brasil e, por exemplo, no Irão (!!), um dos países com maior proliferação de weblogs (uma fuga à repressão?) .
Outro ponto que continua demasiado limitado neste tipo de debates prende-se com os sítios alojados no Blogspot (o Blogger americano). Em rodapé passaram diversos exemplos da actual blogosfera portuguesa (ou muito me engano, ou era mesmo a lista que o Francisco José Viegas mantém no Aviz) e só me recordo de ver o espigas como exemplar alojado noutro sítio, mas que por acaso até usa a mesma ferramaneta, só que em versão brasileira.
Na minha opinião falta um mergulho mais profundo , mais atento ao que se faz por aí, e que nada tem a ver com o Blogspot. Mas admito que para muitos torna-se já difícil acompanhar o passo desta explosão que sucedeu desde há uns meses para cá.
Em suma, faça-se mais programas destes, escrevam-se mais colunas nos jornais, disserte-se mais sobre o tema nas rádios. Nós agradecemos."

Autor: Nuno Centeio
Local: Blogue - Espigas ao Vento
Data: 22 de Julho de 2003
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26. Bruno Sena Martins (Avatares de Um Desejo) produziu um comentário, na sequência de textos de José Pacheco Pereira (Abrupto), Francisco José Viegas (Aviz) e Pedro Boucherie Mendes (Guerra e Pas), sobre a presença/ despresença dos afectos na blogosfera [texto].

Abrupto dá o tom das ausências, Guerra e Pas denuncia-o, Aviz fala-o. Acho que esta era uma inevitabilidade, um prenúncio há muito augurado entre murmúrios e silêncios de ordem vária. Diz Guerra e Pas: "Não tenho a certeza, mas julgo que nunca vi amor na blogolândia." Em boa verdade eu nunca vi outra coisa! Deambulei por milhares de linhas e bytes que se têm escrito, e tenho testificado nos conluios de palavras que a nenhum tipo de debate, confissão ou relato tem havido escusa. A blogolândia abraçou o meu pipi, desacralizando-o como limite, discutiu a política, o sexo, o celibato, os livros, Deus, os mails ansiados, as viagens, as coisas que não voltam, as pinturas, a sedução, as músicas, a guerra, a paz, a solidão, a fnac, a lux, as conversas de café, as estranhas épocas do ano…, ... Sejamos sinceros, o amor não foi apenas um eco murmurado na lasciva promiscuidade de posts. O amor foi um contorno laboriosamente desenhado, um aprimorado desígnio de declarações, o lugar sagrado posto entre sionismo, islamismo e ateísmo, enfim, um artefacto discursivo toldado e cingido pela complexa orgânica de um silêncio. De facto, a nossa cartografia não alcançou tal rigor para que o mapa do império tenha o tamanho do império (Borges), mas a poética da sede imaginária está já firmada numa espécie de linguagem do exterior. O amor é, por isso, a única coisa de que sempre falámos. Abrace-mo-lo.

Autor: Bruno Sena Martins
Local: Blogue - Avatares de Um Desejo
Data: 28 de Julho de 2003
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segunda-feira, julho 28, 2003

25. Manuel Alberto Valente (Oceanos) produziu um comentário ao artigo de Francisco José Viegas no Jornal de Notícias, desenvolvendo algumas questões [texto].

[Q]uando falamos de blogs estamos a falar de portugueses "com educação média e gostos literários acima da vulgaridade". Ou seja, estamos a falar apenas de uma parte (de uma pequena parte) de Portugal. O Portugal profundo, que não lê, que não vai ao cinema, que não vê exposições, que não sabe o que é a Internet - mas que vota! - esse fica de fora deste mundo de éter e silêncio onde residimos nós, aristocratas do pensamento, orgulhosos de poder dar opiniões sobre tudo - da política ao futebol - e convencidos de que a nossa opinião vai transformar o mundo e a vida. Eu sei, claro, que o mesmo se passa com outros meios de expressão. Quem lê o Saramago? Cem mil? Quem lê o "Público"? Oitenta mil? Ou até, quem lê "A Bola"? É que somos dez milhões... Julgo que não podemos perder de vista esta situação, ainda que admita, como dizes, que os blogs desafiem a imprensa escrita. Mas também aí desafiam, apenas. Porque se é interessante ler o que pensam os bloguistas portugueses (e convenhamos que no embrulho vai muito disparate e muita conversa de treta), eles não substituem a informação de um bom jornal. Conclusão: nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Os blogs estão na moda, os jornais e a televisão falam deles, mas convém que cada um de nós tenha a humildade suficiente para perceber que, tal como se mudam os tempos e as vontades, também mudam (ou desaparecem) as formas de dialogarmos com os outros - e com nós mesmos.

Autor: Manuel Alberto Valente
Local: Blogue - Oceanos
Data: 24 de Julho de 2003
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24. José Bragança de Miranda (Reflexos de Azul Eléctrico) produziu uma pequena nota sobre o que apelida de "um certo bloguismo".

Faz parte do livro de estilo de um certo bloguismo a crítica dos medíocres, sempre invejosos do "natural" sucesso daqueles que têm "qualidades". E que se mede pelas citações em rodapé ou pelo sitemeter. Eis uma guerra de manjerico e manjerona que desconhece o básico: a mediocridade denuncia-se a si própria, sem precisar de ajuda, e é prova de mediocridade perder o tempo à sua procura e, mais ainda, a denunciá-la.
Seja como for, diga-se que:
1) todas as espécies têm direito à vida (regra anti-darwiniana básica);
2) aqueles que "têm qualidades", perdão, "qualidade" (forma modesta de se sentir "génio") precisam deles para viverem contentes de si, sendo um contra-senso acabar com eles (regra da piedade bem aplicada);
3) além dos entes "cheios de qualidades" e dos "medíocres" existe mais uma infinidade de tipos (regra que se mete pelos olhos).
Conclusão: os auto-denominados donos do blogo andam jumpies.

Autor: José Bragança de Miranda
Local: Blogue - Reflexos de Azul Eléctrico
Data: 28 de Julho de 2003
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23. Nuno Ramos de Almeida (Muro Sem Vergonha) - jornalista, ex-militante do PCP, membro proeminente da ATTAC e do FSP - produziu uma breve observação sobre a lógica da reciprocidade no mundo dos blogues num post intitulado O Passeio dos Blogs.

Esta "coisa" dos Blogs parece substituir o passeio social ao Chiado dos tempos de antanho. Encontram-se uns cavalheiros, distribuem-se umas palmadas nas costas, comentam-se as últimas e, se aparecer o Dâmaso Cândido de Salcede, dá-se umas bengaladas. A grande vantagem do presente é que dá para comer pipocas e não temos que ver o fácies dos outros tipos. Podemos até julgar que eles são gente normal e inteligente. Para sermos "alguém" neste reino social, a regra é simples: citar, citar, citar sempre. Quanto mais falarmos dos outros, mais eles notam que a gente existe. Como em tudo na vida existem hierarquias. Convém à entrada elogiar profusamente o Pacheco Pereira e o Pedro Mexia à espera que eles murmurem qualquer coisa a nosso respeito. Basta um soluço.

Autor: Nuno Ramos de Almeida
Local: Blogue - Muro Sem Vergonha
Data: 24 de Julho de 2003
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sábado, julho 26, 2003

22. Manuel Falcão (A Esquina do Rio), relatou um seu encontro com Nuno Artur Silva e, a partir daí, produz uma pequena reflexão em torno daquilo que chama de mecanismo das citações recíprocas no mundo dos blogues [texto].

[D]e facto os blogs explodiram e graças ao tradicional mecanismo de «I'll scratch your back, you'll scratch mine» que é tão típico em Portugal. Ganhar notoriedade com um blog não é muito difícil: bastam meia dúzia de citações nos blogs certos e, depois, as coisas sucedem em cascata - e o mecanismo das citações recíprocas ajuda a que tudo funcione em efeito de bola de neve. No meio de tudo fica uma questão: o mecanismo das citações recíprocas anula no entanto o efeito confessional essencial dos blogs - melhor, desvia-o do universo em geral para o universo exclusivo da blogosfera. Até que ponto isto tudo se vai tornar redutor é a dúvida que eu tenho.

Autor: Manuel Falcão
Local: Blogue - A Esquina do Rio
Data: 23 de Julho de 2003
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sexta-feira, julho 25, 2003

21. Texto de José Pacheco Pereira (O Público, Quinta-feira, 17 de Julho de 2003) intitulado o «Depósito Obrigatório da Internet Portuguesa».

Uma parte muito significativa do retrato do Portugal contemporâneo perde- se todos os dias sem apelo nem agravo: a Internet portuguesa. Se bem que eu seja suspeito de querer fazer e guardar o mapa com o tamanho do país que representa, ou seja tudo, nem por isso deixo de me preocupar com essa evaporação invisível dos "bits", assim como de outras formas de "efemera", onde uma parte muito especial do nosso país devia ficar para a memória colectiva.

Guardamos e bem os jornais de paróquia, perdemos e mal as páginas pessoais, os fanzines obscuros, as revistas electrónicas, os blogues apagados, os "sites" de futebol, os locais de raiva e paixão, "hobbies" curiosos, páginas que duram a brevidade de uma campanha eleitoral, elogios e insultos (mais os insultos) nos "newsgroups", "chats" estudantis com linguagens únicas, grafismos de "pastiche", mas reveladores de um gosto ou de escolhas de imitação, músicas experimentais, primícias literárias, obsessões, cultos, etc., etc. Deixo de parte outro aspecto, mais de arquivo do que de "biblioteca", do registo permanente de muita da actividade institucional, governo em particular, e que já se faz usando correio electrónico, que se apaga para sempre, sem o registo mais durável do papel. Nos EUA esta é uma questão controversa, mas para a qual já se avançou com legislação cobrindo o correio electrónico e as mensagens.

O Portugal que fala na Internet é apenas uma parte do Portugal contemporâneo, uma parte muito reduzida, com acesso ao computador, socialmente muito definida, em grande parte urbana e juvenil. Mas a sua voz mostra-se na Internet como em nenhum outro lado, numa altura em que cada vez há menos cada uma destas coisas em papel. E, se não se pode conhecer a vida de uma aldeia ou vila pequena sem o jornal local, mesmo que se fique pelas notícias de formaturas (em desuso a não ser nos jornais de emigrantes), casamentos ou necrologias, também será difícil perceber os nossos dias sem a Internet portuguesa.

Não me refiro sequer às revistas mais estruturadas como a Zona Non ( http:/ /zonanon.com/ ), o Ciberkiosk ( http://www.ciberkiosk.pt/ ) (já falecido), a Storm ( http://www.storm-magazine.com/ ),ou ao excelente "site" sobre o pensamento político no Portugal contemporâneo que José Adelino Maltez tinha e que também parece já ter morrido. Refiro-me ao mais precário, às páginas que um descendente moderno dos autores de monografias locais mantém sobre a sua aldeia, ou ao álbum do fotografias de uma família, ou a uma página de um pequeno clube de futebol ou xadrez.

Veja-se o caso da blogosfera. A blogosfera devia ter um "depósito obrigatório" imediato. Os blogues, enquanto formas individualizadas de expressão, originais e únicas, são uma voz imprescindível para se compreender o país em 2003. Eles expressam um mundo etário, social, comunicacional, cultural, político que, sendo uma continuação do mundo exterior, tem elementos "sui generis". Nenhum retrato da direita portuguesa em 2003 pode prescindir dos blogues da UBL ( http://blogues- livres.mirrorz.com/ ), nem um da esquerda do Blog de Esquerda ( http:// blog-de-esquerda.blogspot.com/ ); nenhum retrato dos consumos culturais lisboetas de vários blogues "culturais" como O Crítico ( http:// criticomusical.blogspot.com/ ), ou a Janela Indiscreta ( http://blog-de- esquerda.blogspot.com/ ); nenhum retrato do jornalismo sem os blogues de jornalistas; nem nenhuma história da obscenidade nacional (uma velha tradição portuguesa de Bocage a Vilhena) pode prescindir de O Meu Pipi ( http://omeupipi.blogspot.com/ ). Mil e um pequenos eventos, concertos de música, sessões literárias, jantares de jovens intelectuais, crónicas sociais de outro tipo de "sociedade", que nunca chegam aos jornais, encontram aí relatos testemunhais complementares dos do jornalismo tradicional. É um bocado como a correspondência no século XVIII e XIX, uma rara fonte para um reverso da história institucional oficial ou dos seus avatares.

Esta é uma tarefa patrimonial importante e é sabido que penso ser o património a essência das tarefas que cabem ao Ministério da Cultura. A lei que obriga ao depósito obrigatório está completamente desactualizada, e uma nova lei está a ser discutida há tempo demais, sem andar para a frente. Algumas tentativas sem continuidade foram feitas na Biblioteca Nacional, incluindo um estudo em colaboração com o ISCTE sobre o "arquivamento" da Internet, já em 2001. Depois disso o que é que se fez?

Quem é responsável, quem manda e não está a cumprir com as suas obrigações? Alguém há-de ser. Entretanto, continua a canalizar-se milhares de livros para instituições que não tem hoje qualquer sentido funcionarem com "depósito obrigatório". O anacronismo da lei aumenta as pilhas de livros e periódicos inúteis porque impossíveis de classificar, catalogar ou disponibilizar, desbaratando esforços que seriam mais úteis noutras actividades. Conheço pelo menos um caso em que vão para o lixo discretamente. Também tenho a certeza de que se lhes quiserem tirar o "depósito obrigatório" vão gritar por todos os lados.

O anacronismo mais prejudicial da lei é a sua dominação pelo papel, por guardar tudo o que é de papel e feito numa tipografia - exceptuando cartões de visita, facturas e impressos ...- e ignorar ou deixar num limbo perigoso todos os outros suportes de informação, ou mesmo espécies em papel que surgiram nas últimas décadas com a facilitação dos meios de impressão.

A lei ainda pensa nas tipografias de chumbo, e não nas impressoras a laser. Eu conheço nalgumas livrarias "alternativas" (e tenho na minha colecção) centenas de espécies que não estão na Biblioteca Nacional. Que tal é a vossa colecção de "O Berro - Arauto da Tertúlia Académica de Direito", do "Laranjinha", boletim do PSD de Torres Novas, do "Mais por Sintra - Jornal de Campanha da Candidatura de Edite Estrela" ou da "Voz do Povo - Boletim Informativo dos Grupos de Estudo Che Guevara" ? Pode ser que tenha acertado em algum que exista nos catálogos, mas não me parece. Quem guarda os CD-ROM, quem guarda os discos alternativos, quem guarda os fanzines, quem guarda os panfletos políticos e a parafernália dos objectos de campanha, quem guarda os arquivos digitais, quem guarda a Internet portuguesa?

Ninguém, diz o romeiro.

Autor: José Pacheco Pereira
Local: Imprensa - O Público
Data: 17 de Julho de 2003
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quinta-feira, julho 24, 2003

20. Ao vigésimo "post", Metablogue saltou para lá da Blogosfera e foi ter com o texto que Francisco José Viegas fez publicar hoje no Jornal de Notícias. Nem é preciso explicar porquê.

A blogosfera


De repente, a descoberta da blogosfera veio para as páginas dos jornais. José Pacheco Pereira publicou alguns artigos sobre a matéria e o essencial disse-o ele: é impossível saber o que pensa o Portugal dos anos 90 sem referir a blogosfera, o mundos dos blogs, a travessia imediata da internet por cidadãos anónimos ou com nome que, diariamente, dão opinião, escrevem sobre todos os assuntos (de política a medicina, de sociologia a arquitectura, de literatura – sobretudo – ao dia-a-dia de gente que não conhecemos). Essas pessoas já não têm lugar fixo: existem no éter, esse estádio luminoso que se liga ao mundo por um cabo, por um modem, e que é lido onde quer que seja. Ninguém é, exclusivamente, de Lisboa. Mas pode-se viver em Seia ou em Ponta Delgada e isso não ter qualquer importância: escreve-se no éter. E qualquer um pode fazê-lo sem mediação das instituições tradicionais do jornalismo ou da edição. O que tem riscos consideráveis e exerce um fascínio incontrolável sobre os que querem dizer qualquer coisa e podem fazê-lo.

Para leigos, a blogosfera, o mundo dos blogs, também deixa de ser um produto alquímico ou tecnológico – está ao alcance de todos, dos olhos de todos, de todas as audiências. Está à distância de um rumor e de um gesto simples: um endereço na net, de um link a outro passa-se depressa. Uma das questões mais discutidas a propósito dos blogs tem a ver com a sua relação com o jornalismo. É, de qualquer modo, uma falsa questão. Os blogs não põem em risco o jornalismo, evidentemente, nem os jornais: mas desafiam-os, obrigam-os a moderar a sua marca ideológica e as suas tentativas de manipulação, lançam reptos à preguiça das redacções e à sua modorra, provam que não é preciso ser-se profissional do jornalismo para escrever sobre a passagem do tempo ou sobre a actualidade – mas que o profissional do jornalismo deverá ser mais exigente, mais rigoroso, mais culto e mais informado do que tem sido até agora. Sobre política internacional, que é o domínio onde as redacções são mais preguiçosas, incultas e sensíveis à demagogia e à propaganda, quase todos os blogs são mais interessados e fornecem mais informação. Onde a Imprensa é declaradamente parcial, os blogs protestam e fornecem outras explicações, dão um passo em frente, arriscam e não temem nenhuma censura, nem a "correcção política" dos sacerdotes tradicionais. À Esquerda e à Direita (mas sobretudo à Direita – cuja percentagem já foi mais elevada do que hoje), os blogs libertaram-se da Imprensa dos mandarinatos (e do poder da "geração de 60") e revelam muitas vezes as suas falhas. De facto, é impossível saber o que pensa o Portugal dos anos 90 sem recorrer à internet, sem recorrer aos blogs – mais do que às teses de doutoramento dos sociólogos. É um mundo desordenado, cheio de vícios, de revelações sobre o banal e o extraordinário que habitam em cada português com educação média e gostos literários acima da vulgaridade. Por isso, os mandarins temem essa opinião – desvalorizam-na por ser tão frágil e apenas viver no éter, lá onde as revoluções olham de cima o traçado dos geógrafos. Não se trata apenas da relação cada vez mais próxima entre autor e produto do seu trabalho, como predisse Walter Benjamin. Trata-se de uma batalha pela voz. A Imprensa só tem a ganhar, se compreender esta ideia.

"A Blogosfera" na edição online do JN


Autor: Francisco José Viegas
Local: Imprensa - Jornal de Notícias
Data: 24 de Julho de 2003
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19. Américo de Sousa (Retórica e Persuasão) promove, a partir de uma observação de José Bragança de Miranda, uma breve reflexão em torno da relação entre o poder, a retórica e a sedução no mundo dos blogues num post intitulado «Blogues: poder, retórica e sedução».

A expressão é livre. O espaço é gratuito. Mas nem por isso a Blogosfera fica imune às estratégias de poder, como bem salientou José Bragança de Miranda. Quem lê os blogues com alguma atenção percebe que, do ponto de vista relacional, a Blogosfera não é, afinal, um mundo muito diferente dos outros mundos da vida. Aqui, como "lá fora", nascemos todos iguais, mas acabamos por ser todos diferentes. E, como se sabe, são inúmeros os factores que originam essa diferença.

A afinidade de interesses, valores ou ideias, a existência de uma rede comum de ligações pessoais e desde logo, um mínimo de prévio conhecimento pessoal, estão seguramente por detrás da discriminação (positiva?) a que aqui se assiste, não só em termos de "blog-etiqueta" (boas vindas, etc.), como na atenção e insistência com que se elogia ou polemiza quase sempre com os mesmos blogues. Mas é natural que assim seja. Porque compartilhar este "espaço electrónico" não significa, obviamente, o anular das respectivas diferenças ou distâncias pessoais.

Logo, quem não se conforme com tais distâncias deve tomar a iniciativa de formular a questão e propor o debate. O que significa... fazer retórica. Porque a retórica, segundo Michel Meyer, traduz- se, precisamente, na negociação da distância entre os homens, pelo recurso a "(...) uma lógica da identidade e da diferença, identidade entre eles ou identidade de uma resposta para eles, apesar da diferença entre eles e entre as suas múltiplas opiniões e saberes" *. É certo que nem a melhor argumentação garante o êxito. Mas é justamente esse o registo mais democrático da retórica: liberdade de opinião, respeito pelo outro, aprovação consensual. Nem os argumentos aprovados são tidos como racionalmente definitivos ou evidentes, nem os rejeitados perdem o seu valor só porque não foram reconhecidos. O saldo retórico é sempre positivo. Nuns casos, porque leva à deliberação ou soluçao pretendida. Noutros, porque permite aprofundar a compreensão da própria questão ou do conflito em aberto.

Não se pode esquecer, porém, que numa boa retórica (ou argumentação) é necessário, antes de mais, captar a atenção do auditório (mesmo que eventualmente representado por uma só pessoa). O que, naturalmente, pode ser favorecido por um certo "quid" de sedução. De sedução entendida aqui como figura do agrado, do prazer, do bem estar, ou seja, como pertencendo mais à esfera do gosto do que à da fria e etimológica racionalidade com que, de uma penada, se pretende muitas vezes remetê-la para o puro engano. Não admira por isso que alguns dos blogues mais "notáveis" apostem igualmente numa estratégia de sedução, em ordem a alargar os seus "centros de influência" (blogues a que se referem ou que publicitam) e, ao mesmo tempo, a exponenciar a receptividade do seu auditório geral. Pensando bem...que mal há nisso? Não é assim que vivemos "lá fora", também?

Autor: Américo de Sousa
Local: Blogue - Retórica e Persuasão
Data: 23 de Julho de 2003
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18. Bruno Sena Martins (Avatares de um Desejo) ofereceu agora mais um contributo para a fenomenologia da experiência do blogger. Num post intitulado «A Agonia do Blogger Perante o Site Meter», o Bruno desenvolve o tema das potenciais «ameaças» dos contadores estatísticos.

Os Site Meters estão na ordem do dia. Através deles o blogger pode perceber que tem andado a escrever numa agonizante solidão, pode descobrir-se rodeado de olhares compensatórios, pode sentir-se, talvez, demasiado exposto. Todas estas possibilidades se entrecruzam nas nossas vivências mais amplas engendrando frustrações, regozijos e ansiedades. Os sitemeters constituem uma outra versão da busca de citações nossas noutros blogs ou da espera de emails. No fundo (como diria Levi- Strauss), uma outra versão do mesmo mito.

Expressões que reputo de honestas e representativas do que aqui nos traz:
Dicionário: mantenho um blog em grande parte por causa do feedback
Abrupto: porque na concepção deste blogue é gratificante para o seu autor que seja lido

Será que generalização dos Site Meters vai levar a uma "selecção das estatísticas mais aptas" pelo eventual desânimo que possa causar nos bloggers que se virem vocacionados para a clausura da invisibilidade online? (vs. [socioblogue] Por conseguinte, interrogo-me: será que estive até agora encarcerado no meu «self offline»?»).

Espero que não, o espectro da perda de diversidade assusta-me, além do mais todos os dias tenho surpresas em blogs recônditos. A ideia que só os "mais aptos" sobrevivem é demasiado igual ao mundo em que vivemos. Importa que se desenvolvam nichos minoritários feitos de empatias plurais. Sugiro um nicho temático que surja como garante da diversidade que temos hoje, seria algo do género: "o meu Site Meter diz- me para acabar com o blog".


Autor: Bruno Sena Martins
Local: Blogue - Avatares de Um Desejo
Data: 24 de Julho de 2003
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quarta-feira, julho 23, 2003

17. Em Veto Político, uma perturbação que se partilha, com alguma inquietação. Contextualizando, que o excerto cortou a direito essa informação, Veto Politico questiona-se a partir de uma situação em que, confrontado com uma noticia de televisão que animava um determinado repasto, a única informação que dispunha eram os posts lidos na Blogoesfera [texto]:

A perturbação pode enveredar por duas vias: as inflamadas e conteudísticas discussões na blogosfera afastam a minha atenção daquilo a que se pode chamar eventos menores; ou, a blogosfera já dominou por completo a minha vontade, ou encontro-me satisfeito com o acesso à informação que terceiros me proporcionam, que não necessito de mais do que ler a sua opinião. A primeira é certamente a mais aprazível, notarei uma evolução no meu comportamento, serei agora um indivíduo que considera que há trivialidades que o simples conhecimento geral é suficiente, resguardando anímica para outras discussões mais prementes, para um outro nível de informação. O reconforto que retiro desta primeira hipótese não é suficiente para afastar o negro espectro da segunda: que me estupidifiquei perante uma máquina, em que contacto com a realidade através do que outros dizem e as súmulas dos jornais on-line providenciam. Por trás de todo este fascínio por um universo em que todos podem dar a sua opinião, e em que todos podem retirar conhecimento pela interacção, pela troca emails e\ou trabalhos académicos, se sugere sítios na net, estamos na verdade a renegar uma visão mais própria, mais pessoal, mais empírica, mais factual? Estaremos a criar, encapotadamente, uma alienação que todos os arautos da desgraça profeciam para o século das novas tecnologias?"

Autor: NRF
Local: Blogue - Veto Político
Data: 21 de Julho de 2003
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(Ao terceiro dia de Metablogue, uma parceria: Socioblogue entra nesta aventura de editar este observatório da discussão e da reflexão metabloguista, juntando-se assim a Respirar o Mesmo Ar.)
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16. De A Carta Roubada, que também cumpre funções de metablogue, uma conversa sobre blogs, com intromissões de Giles Deleuze. Lamentamos não conseguir reproduzir o exacto das palavras que dançam neste blog.

Sobre os blogs e a forma como se organizam chamo a fala de Deleuze em “Dialogues, 18”:

"En chacun de nous, il y a comme un ascèse, en partie dirigée contre nous mêmes. Nous sommes des déserts, mais peuplés de tribus, de faunes et de flores. Nous passons notre temps à ranger ces tribus, à les disposer autrement, à en eliminer certaines, à en faire prospérer d’autres."

Se me fosse possível traduzir sem atraiçoar estas palavras o que poderia dizer não seria mais do que Deleuze escreveu sobre as tribos que nos habitam, bichos e plantas. Passar o tempo a arrumar as tribos de uma forma ou de outra. A “matar” tribos, a alimentar outras tribos.

E ainda, Deleuze “Dialogues 13”:

“Quand on travaille, on est forcément dans une solitude absolue. On ne peut faire école, ni faire partie d’une école. Il n’y a de travail que noir, et clandestin. Seulement c’est une solitude extrêmement peuplée. Non pas peuplée de rêves, de fantasmes ni de projets, mais de rencontres. Une rencontre, c’est peut-être la même chose qu’un devenir ou des noces. C’est du fond de cette solitude qu’on peut faire n’importe quelle rencontre. On rencontre des gens (et parfois sans les connaître ni les avoir jamais vus), mais aussi bien des mouvements, des idées, des evénements, des entités. Toutes ses choses ont des noms propres, mais le nom propre ne désigne pas du tout une personne ou un sujet. Il désigne un effet, un zigzag, quelque chose qui se passe entre deux comme sous une différence de potentiel (...)”

Falou. Da solidão absoluta no trabalho. Que do trabalho se vive e como se vive senão em solidão. Vai longe Deleuze na interpretação do trabalho que diz ser clandestino e negro, escuro (virá da noite?). Da solidão diz-nos estar povoada de encontros. Aqui com Deleuze, um encontro. Uma festa? É do fundo desta solidão que se produzem toda a espécie de encontros. Podemos encontrar pessoas que nunca vimos, que não conhecemos. Mas também nos encontramos com movimentos, ideias, entidades. Todas as coisas, diz Deleuze, têm nomes próprios. Não fala do sujeito mas de um efeito. Chama-lhe zigzag. Eu chamo-lhe desejo.

Quem aqui fala tem o desejo, veemente, de falar/dançar.

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15. Opinion Desmaker levou a Blogolândia ao divã:

Andei pelos blogs.
Comum a todos : – e isso é normal – gostam de ser lidos, estão à espera disso e sem essa perspectiva morreriam.
Alguns precisam que haja um círculo muito especifico que os aprecie e releve. Tornam-se um bom disfrute para os próprios, já por vezes mais desinteressantes para terceiros (que têm bom remédio também...)
Há uns mais repentistas e outros mais pensados. Contudo ,os primeiros não existem - de todo - em estado puro e os segundos se se esticam muito perdem a validade
Nalguns encontramos o claro desejo de liderarem os temas, de servirem de centro da discussão, de marcarem a agenda, mas parece-me um desejo que, pela natureza da arbitrariedade deste meio, acabam por não satisfazer totalmente, julgo...
Há blogs vaidosos. Há de facto. Quase todos esses têm um pouco de razão para essa vaidade. Há, no entanto, alguns que são sóbrios e até humildes, e é aí que também se encontra muito do seu valor.
Os blogs que apostam na ironia, em geral sobrestimam-se. São, no entanto, os que mais podem surpreender. São também, por ironia, os que mais se podem tornar irrelevantes.
A originalidade é quase sempre um beijo de Judas. Quem vive apenas em função dela será atraiçoado mais tarde ou mais cedo ( um tema agora em voga ...). Nota: a erudição também é muito traiçoeira...
A “efemeridade” é uma dimensão relativamente bem organizada por aqueles que - por ocupação regular- escrevem e têm um outro auditório mais normal ou fixo, e relativamente mal gerida pelos outros ( eu por exemplo ...)
Há ainda uns quantos , que eu até aprecio mais agora, que parecem mais livres...estão lá no seu mundo, como se os outros não existissem, mas acabam por afinal também estar presos à sua aparente não-temporalidade.
No fundo isto é o espelho do mundo e das gentes, dos corpos e das almas.
Como não podia deixar de ser.

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terça-feira, julho 22, 2003

14. Memória Inventada. sobre "guerra sem sangue" na blogosfera:

(.../...)
Voltemos pois à blogosfera. A minha tese é muito simples: há competição na blogosfera mas não estamos no domínio das garras e dos dentes. Há diversidade, o que estimula a comparação e acaba por desencadear algumas respostas que, dependendo da natureza de cada um, podem conduzir a processos de mimetismo ou de diferenciação. Pode também levar alguns a desistir e outros a investir ainda mais neste passatempo. A diferença em relação à natureza é que não há limitação de recursos. Todos sobrevivem, dos muito maus aos muito bons, dos que quase nunca escrevem aos que lançam 20 posts por dia. A selecção que existe na blogosfera é desnaturada, mas a blogosfera é um melhoramento da natureza. Como não exclui ninguém, torna-se mais justa. Ao preservar todos os blogues, mesmo os que já acabaram, oferece-nos um registo fóssil irrepreensível. Actuando de forma benigna sobre os nossos impulsos competitivos e a nossa vaidade, ganha uma dinâmica impressionante que fica com o melhor da selecção natural mas dispensa o que esta tem de horrendo. Na blogosfera há uma guerra sem baixas, um combate sem feridos. Não inventámos nada que os lagartos e os alces não pratiquem, mas eles demoraram mais tempo do que nós a descobrir as virtudes dos combates ritualizados.
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13. Flor de Obsessão, associando o bloguismo a um certo tipo de individualismo construtivo e - se percebemos bem, o que pode não ser o caso - terminando com um esboço de uma ideia que nos poderia levar longe na conversa, o modo como a febre blogueira realiza principios de harmonização das sociedades, especialmente liberais:

(.../...)
Claro que a exaltação da individualidade, que muitos de nós executam afincadamente nos blogues, não é a defesa de um género destrutivo e asocial de individualismo. Muito menos, é a improvável certeza de que todos temos uma «verdade», uma «expressão», um «caminho» dignos de ser narrados como se de uma epopeia se tratasse. Eu creio que há dois planos diferentes neste assunto: os blogues, por um lado; o expressionismo individual, por outro. Nos blogues, existimos no meio de uma rede de identidades, identidades verdadeiras, falsas, construídas, artificiais, o que quiserem, mas identidades. Fora dos blogues, na vida comum, as coisas são mais complicadas. Ninguém é melhor pessoa por ser ela própria, por ter uma «identidade», por escrever (se essa for a sua «identidade»); bem pelo contrário, e basta olhar para a literatura, ou para a história do crime, para percebermos isso. Sermos nós mesmos até pode ser muito pouco, se não houver um módico de razão, de discernimento, de valores e ideias acima das nossas cabeças, a certeza de que o mundo gira e continuará a girar sem nós, de, muitas vezes, as melhores decisões serem precisamente aquelas que mais nos contrariam. O caso de Emerson: como todos os transcendentalistas, Emerson exagerava nesse culto das potencialidades do eu. Eu posso acreditar que o mundo, a História, a natureza, a súmula de todas as ideias, confluem na minha cabeça. Posso acreditar que basto, que me basto, que não preciso de mais nada (e a seguir construo uma casinha num sítio recôndito). Posso acreditar que a auto-afirmação é tudo. Os blogues podem ser um pouco assim porque a função dos blogues é pôr-nos a escrever e a alimentar um diário público (como é evidente, muitos de nós não escreveríamos não soubéssemos que estamos a ser lidos e, por isso e só por isso, creio que os blogues não-individuais, ligados a projectos científicos, de investigação não são verdadeiros blogues). A função dos blogues, tão pequena, é essa. Não é outra. Fora disso, temos um imenso mundo onde é pouca coisa dizermos: “Isto sou eu porque sou eu” ou “Esta é a minha identidade” ou "Vejam o que eu tenho para dizer". E, no entanto, apesar disso, temos esta verdade evidente e descarada: as sociedades, e sobretudo as sociedades liberais, precisam de cidadãos felizes, se quiserem de cidadãos satisfeitos
(.../...)

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12. Heterodoxias, assim:

Durante algum tempo, pensei que seria interessante ter uma coluna num jornal. Achava que a possibilidade de opinar com regularidade seria benéfica e iria fazer nascer textos úteis e interessantes. Presunção minha... Por outro lado, para uma pessoa que tem a mania de ter coisas para dizer, como eu, parecia desperdício não haver quem lhas veiculasse. Pura estultícia. Esse não é o critério... Acontece, por acréscimo, quando acontece.
A minha opinião sobre esse assunto foi-se tornando céptica e cínica, e mudou completamente depois de ter um blog. Um blog é a possibilidade de opinar excatamente quando se quer. Para um público, no meu caso muito selecto - mas isso é o bem ou o mal dele -, mas para um público, em todo o caso. Ora poder-se dizer o que se quer quando se quer para o nosso público é um privilégio muito maior que mandar semanal, quinzenalmente, umas laudas com tamanho pré-definido a um jornal que, no limite, até nos pode censurar, advertir, ou fazer cessar a colaboração.
E o fenómeno mais interessante que se produziu foi este: dou comigo a não dizer aqui nem uma ínfima parte do que penso. Creio que é também uma reacção à incontinência de outros na blogsfera. Se tudo se ataca, se tudo se desdenha, se tudo se louvaminha, se tudo se comenta, se o volume de coisas que se dizem é poluentemente enorme (e dificilmente pode deixar de ser assim: porque não há temperança), então seja eu contido.
O Heterodoxias não é, pois, só o que diz. É, em grande medida, o que escolhe dizer, e o que não diz.
Prometeu no início não comentar más notícias. Só em parte conseguiu resistir... Mas no geral cumpriu.
Explica agora que só fala do que lhe apetece, e por vezes não fala do que lhe apeteceria... Porque há que manter alguma respirabilidade do ar...

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segunda-feira, julho 21, 2003

11. Guerra e Pas, que com muito humor no outro dia se queixava de se sentir o Alverca do Abrupto, desenterrou o machado de guerra contra a Blogolândia:

OS ONANISTAS
A blogolândia está cada vez maior e cada vez menos interessante. Chegam e estão a chegar VIPs e desconhecidos que acrescentam pouco e se excitam com óbvio. Morreu Abelaira? Se a história de Portugal fosse feita a partir dos blogs, verificava-se que o homem era um escritor ímpar, injustiçado no seu tempo e que só a morte porá no Olimpo, ao lado de Pessoa, Camões e Camilo. Morreu Compay Segundo? Oh, meu Deus, a Cultura do mundo está mais pobre, nada será como dantes. Já com K. Hepburn tinha sido o mesmo nojo nostálgico, porque, no fundo, quando os blogs falam dos mortos, aproveitam para falar deles mesmos e de como eles, os blogs, têm pena disto e daquilo. É uma pena que também os blogs gostem tanto de falar bem dos (inofensivos) mortos, mas é sintomático da falta de assunto e da velhacaria que é não suportar não alinhar na corrente. A blogolândia (já) fede. Em breve, estará podre e morta. e nessa altura, quem falará bem da blogolândia, como um ágora no ciberespaço, uma seara de novas ideias, uma nova esperança para Portugal?

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10. Há como no sexo, metablogues explicítos e outros, implícitos. Como este, em Deslizar no Sonho:

Solidão
Alguém disse que a grandeza de um espírito se mede pela quantidade de solidão que consegue suportar. Se assim é, eu devo andar mais ou menos pelos dez centímetros, que segundo as minhas contas, corresponde aproximadamente ao tempo que necessito, diáriamente, para a minha higiene interior. Talvez, por me relacionar assim com a solidão, temo estar sozinha. Estar sozinha, como hoje, é estar sozinha de ti.

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9. Respirar o mesmo Ar tenta o modo de ser provocação. Nós retirámos este excerto e viemos embora.

Blag-Blag-Blag...

Se veio aqui parar vá embora.
A sua presença é desnecessária, gesto de voyerismo inútil. Um Blog não é para ser lido, é para ser escrito. Lipotevski anunciou, em "A Era do Vazio", que um dia cada um de nós se tornaria expressão e riso de si mesmo. A Blogoesfera cumpre a profecia com rigor.

(.../...)

E não é nada contra si, não comece a fazer-se de vitima. Acredito que você seja diferente. Mas se lhe abrisse a porta a si, tinha de deixar entrar o resto. Tinha de conceder que vivo no mesmo tempo de personagens do meu horror. Até teria de servir chá e os bolinhos da avó a tipos como o Bush, Berlusconni, Aznar, Portas, Le Pen, Fraga Iribarne, Bin Laden...xô! Xô!.

Não, vá-se embora. Havia alguém que dizia (referindo-se ao Diário de Anne Frank), citado por Alçada Baptista numa crónica já bolorenta que tenho aqui no meu sotão, que numa ditadura o diário é o único diálogo possivel.. Substitua-se ditadura por HOJE e diário por BLOG, e o resto que fique como está.

NADA DE CONFUSÕES. SOMOS OBRIGADOS A RESPIRAR O MESMO AR, NÃO O MESMO TEMPO.

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8. De Cruzes Canhoto o alerta para um tipo de existência únicamente metabloguiana :

BLOGUES - Há cada vez mais blogues peculiares. Este por exemplo, dedica-se a criticar acutilantemente os outros blogues. E fá-lo com tal ferocidade que nós já começámos a fazer escudos de protecção. (.../...)
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7. O Metablogue também surgiu aqui, depois de lermos esta ideia no Abrupto. Até porque há nele uma incontida esperança.


Eu sou um adepto do meta-bloguismo, embora pense que o excesso do dito levaria a uma esterilidade completa. O meu meta-bloguismo vem de não conseguir usar um meio sem me esforçar por o perceber. Num primeiro tempo, este olhar “tira” liberdade, condiciona, “prende” e por isso o meta-bloguismo gera sempre um certo mal-estar. Mas há um segundo olhar, que se calhar também vem com o primeiro, que acaba por nos dar uma ainda maior liberdade. Eu sou da escola de quem pensa que conhecer liberta. Não há provavelmente maior ilusão nos últimos duzentos anos, do que achar que as “luzes” alumiam, mas eu prefiro um mundo em que se proceda (eu disse proceda e não acredite) segundo essa ilusão.

(.../...)

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6. A honestidade compensa, em Avatares de Desejo E também a delicadeza de sentimentos em relação aos nossos amigos imaginários:

grato
Noto que cada vez uso menos interlocutores fictí­cios neste blog. Tenho recebido mensagens. Sim, daquelas mesmo a sério. Em boa verdade, prefiro assim... Espero que as minhas ficções não me levem a mal!

Fica a promessa: não me esquecerei d@s emissári@s imaginári@s

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5. De Caderno A6, já aqui citado pelo Socio[B]logue. Voltar atrás ao metablogue de Reflexos de Azul Eléctrico, antes de responder à pergunta final.

Post de observação
Entretanto, faço uma ronda rápida por uma série de blogs nacionais, que o tempo e o sono não permitem demoras. O que observo? Metade do espaço é ocupado em vénias e agradecimentos de uns para os outros; uma boa parte do que resta é gasto em diálogos cruzados sobre os mesmos assuntos (a polémica DNA/Pedro Rolo Duarte, assunto interessantíssimo, está no top), todos ao mesmo tempo, como nas discussões de café, ou debates políticos na tv: uma algazarra de resposta e contra resposta em simultâneo onde rapidamente se perde o fio à meada. Não seria melhor optarem por um chat? Pelo menos haveria uma ordem de entrada que dava muito jeito.

Os poucos blogs que frequento com regularidade são autistas. São feitos por gente que parece ignorar que os seus escritos podem ser lidos por qualquer um que tenha um computador à frente. Vivem perdidos em grandes cidades americanas, vilarejos argentinos ou no interior brasileiro. São vizinhos que escolhi para encostar o ouvido à parede (ao ecrã) e escutar as suas vidas. Às vezes são mal escritos. Às vezes chatos. Às vezes comovedores. Às vezes gloriosos e felizes.

Mas são questões de gosto, certo?

Pergunta para acabar o dia: quando vai começar a grande desistência e desinteresse em massa dos blogs nacionais?


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4. De Aviz, um metablogue com a pele à flor do pensamento:

UM TEXTO LONGO, SIM. Ora, não me lixem. Às vezes há distracções nos blogs, naturalmente, e vê-se onde cada um quer chegar — a qualquer lugar muito longe, a qualquer lugar muito perto. Mas irrita-me muito aquele ar de circunspecção polida, muito culta e importante, escandalizada e correcta ao mesmo tempo. Todos querem ser o «observatório que não é observado», aquele que repara em todos os defeitos dos outros, aquele a quem nada comove, aquele para quem uma coisa é sempre outra, muito pior, muito enganadora. Ah, eu sei, todos sabemos, as pessoas fingem, exibimo-nos em todo o lado, citam-se livros, fala-se de filmes, discos, bandas, viagens, retratos, tudo o que comove. Mas irrita-me o tom, esse tom de quem desconfia que só o próprio é que lê os livros que leu — e leu, certamente. Mas as mentiras dos outros também são agradáveis, detectam-se com facilidade, paira sobre elas uma aura de vulgaridade. Desiludimo-nos? Não: a vida é assim mesmo, contabilizamos doutoramentos com bibliografias frágeis, artigos com rabos de fora. Irrita-me quem veio aos blogs para moralizar e evangelizar, espalhar a verdade, ganhar adeptos, praticar a pior das coisas que é o proselitismo no meio da tempestade e da desgraça. Porque se não houvesse desgraça não havia «blogosfera» (essa comunidade de cinquenta e seis ou oitenta e dois amigos que se conhecem e falam uns para os outros, e se cumprimentam, se visitam, se irritam), as pessoas viam televisão e faziam piqueniques debaixo dos sobreiros ou iam à pesca para a beira do mar. Mas irrita-me isso, sim, essa tendência para não ironizar, para fazer de tudo uma campanha brutal contra a fragilidade dos outros e contra os seus pecados, as suas falhas, as suas indignidades, as suas mentiras — está tudo tão à vista, aqui.
Repito: está tudo tão à vista, aqui — os que contam as visitas e as page-views, os que não resistem a dizer que foram citados. Mas há os outros, sim: os que escrevem — e pronto. Os que dizem o que querem dizer. Os que se estão nas tintas. Os que têm uma palavra que não nega que gostava de ser lida? É isso um pecado assim tão criticável, tão menosprezável? Quando é que as pessoas escrevem — e pronto? Quando é que passam a escrever o que querem mesmo dizer, escondendo aquilo que acham que é para manter escondido, e não estão com muitas justificações, lapsos, vulgaridades, paralaxes?
Há nos blogs uma fragilidade muito evidente: são coisas que se escrevem porque sim, porque apetece naquele momento, porque nos lembramos, porque alguém falou disso, porque a ventania vem do lado do mar, porque o pó se levantou no meio do deserto em frases curtas, em textos longos, ou porque começou a chover no domingo. Essa fragilidade é um bem porque podemos discutir com ela — ou comover-nos. Ah, mas claro que a comoção é um perigo, tal como a pieguice, a lamechice, o horror aos outros, sim, claro que é. Mas pior do que isso vão ser os blogs dos deputados quando o parlamento publicar o livro de estilo (será como o código de conduta do Expresso?).
E por que é que os oitenta e dois amigos ou os cinquenta e seis conhecidos não hão-de poder falar uns para os outros? Entre mil blogs portugueses, por que é que não se hão-de conhecer e dizer «piadas privadas» e falar do que lhes apetece? E por que é que tem de começar a haver auto-censura estabelecida para que fulano não desça do púlpito, a desancar? Não me lixem. Vigiemo-nos, comentemo-nos em regime de permanência. Por que é que não se há-de ser a poeira da praia?
A nossa escravidão, desde a infância, é definir «posse» e «poder». O vazio é o único lugar de encontro quando descobrimos essas circunstâncias — e, nesse lugar, compreender não é concordar, tal como discordar não significa não compreender. Um comentador do Talmude dizia que devíamos fugir da superstição e da crendice, das faúlhas do céu — mas que, na verdade, não se pode viver sem essa chama de irracionalidade, tal como a certeza absoluta é um acto de idolatria, de imprescindibilidade — e a imprescindibilidade é a idolatria com pés de barro. O que tem a ver com outra característica que anda aí à solta, oscilando entre a agressividade e a vitimização: ambas são compensações, claro, compreensíveis, somos humanos, tão humanos. Nos blogs, a única coisa a cobiçar é a aceitação dos outros, o reconhecimento — não os livros que os outros leram ou não leram , os actos de censura, a comunhão ideológica. Isso é tão humano como a chama de irracionalidade que não se pode afastar da vida inteira, sob pena de a «vida inteira» ser só «parte dela», a mais visível, a mais autoritária, a mais inflexível. Quem tem listas de reivindicações sobre o presente e culpados permanentes a apontar, vê reduzida a sua margem de criatividade.
E o riso. O riso de todas as maneiras. O riso devia ser o centro de muitos debates, contra o risco de intelectualizar toda a linguagem, isto é, de lhe criar uma autoridade escolar em anexo (sim, como attachment). Há pessoas que riem muito, há pessoas que riem pouco, há pessoas que só riem e há gente que não ri nem sabe rir. Não é obrigatório rir em nenhuma circunstância (o Nuno Costa Santos criticava essa tendência para a «obrigatoriedade do humor» nos blogs, a obrigatoriedade de se «ser engraçado»), mas o riso é um caminho que nunca se pode evitar. Tal como a ironia, a piada. A pequena piada. E rir de si próprio sobretudo, não se levar tão a sério.

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3. Em Reflexos de Azul Eléctrico, dois posts num só metablogue:

Blogando (5)
Foi tão longo, tão longo que, como Deus depois de ter feito a sua obra, pôde descansar e retirar-se da História. O essencial estava (per)feito. A partir de agora pode começar a Igreja dos fieis, essa pequena circunvalação.

(.../...)

liberdade
Imaginemos que um governo obrigava a todos os indivíduos, por lei, a que assistissem à televisão ou a blogarem. Teríamos revolta pela certa. Mas esses mesmo individuos fazem-no livremente e sem qualquer hesitação. Como é que se chegou aqui?

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2. O Feedback, segundo o Dicionário do Diabo:

FEEDBACK: Se querem uma explicação psicanalítica baratucha, tomem lá esta: mantenho um blog em grande parte por causa do feedback. Cheguei a passar quase um ano a escrever no DN e a não ter a mais pequena reacção ao que escrevia: nem cartas, nem mails, nem polémicas, nem bocas, nem elogios, nem hate mail, nem palmadinhas nas costas, nem rasteiras, nem bengaladas. Nada. Nos blogs tenho tido a sorte de ter imenso feedback, em todas as formas atrás referidas. Muitos desses mails são puramente de concordância ou discordância sumárias, mas outros apontam pistas, corrigem dados (e gralhas), dão interpretações diferentes, dissertam sobre um ponto que menorizei, e assim por diante. Ainda não comecei realmente a publicar cartas, como fazia na Coluna, em parte por causa das avarias técnicas e de ter a caixa a abarrotar, mas como disse vou em breve fazer um primeiro apanhado. O feedback não significa, como pensam sempre os maldosos, vida social fora do blog (não é isso, de todo, que procuro), mas apenas um alargamento do espaço de troca de ideias, opiniões, impressões, amores e desamores. É uma pequenina e simpática utopia. Keep writing, folks.

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1. Não é por acaso que este texto, publicado em Socio[B]logue abre este blogue.

McLuhan, o Meio e a Mensagem
Caderno A6, num texto caracterizado por uma sobriedade analítica invejável, chama a atenção para o facto da discussão em torno dos blogues ser, em seu entender, excessivamente prematura. O autor atribui essa «volúpia reflexiva» ao período de euforia que parece caracterizar, tradicionalmente, a introdução e consolidação das inovações tecnológicas. Prematura, segundo o que sugere, devido ao facto de "estarmos em plena época de blogomania". E, como acrescenta, "a blogomania, pouco diz sobre os blogs". O problema deste debate - problema, aliás, ao qual o Socio[B]logue não será alheio - não é apenas o facto de ser algo prematuro. Mas o facto de se concentrar - em excesso - na forma, obnubilando, parcial ou totalmente, o conteúdo. Ou seja, parece haver, neste momento, uma preocupação maior com os blogues, enquanto forma, o que com aquilo de que os blogues falam. Há alguns dias atrás, Torill Elvira Mortensen (Thinking With My Fingers), num contexto diverso do nosso (europa do norte; onde existe uma comunidade de blogues de investigação impressionante), parecia reportar-se à mesma questão. Evocando McLuhan, manifestava alguma preocupação "about the focus being too much turned to the form itself. As if the fact that a message is communicated by way of a blog is more important than the message." [texto]. Relembremo-nos que foi o incontornável Marshall McLuhan quem, ainda em 1964, cunhou a expressão "the medium is the message", naquele que é, sem dúvida, um dos maiores textos clássicos no campo da sociologia da comunicação. Se é evidente que é importante compreender as características deste novo meio e os impactes pessoais e sociais associados à sua utilização, parece ser igualmente óbvio que isso não justifica a sobreposição da forma ao conteúdo. Fica, portanto, a nota de culpa.

McLuhan, Marshall (1964 [1994]), Understanding Media: The Extensions of Man, London: The MIT Press

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Nota Editorial Mínima:
Metablogue nasce para ajudar a libertar a blogosfera da autoreferencialdade avulsa, perdida nos espaços intimos de cada blogue. Ou para a enriquecer com a autoreferencialdade que se vai escutando, avulso modo, nos mais íntimos espaços de cada blogue.
Metabloque não é um blogue de Hits. Nem um bligue de hots. Seja lá o que isso for. É apenas um blogue. O Metablogue. Não sabemos fazer tricot, experimentamos o ponto de Arraiolos com blogues. E logo se verá.
Metablogue é um blog colectivo. Serão incluídos apenas os posts já publicados noutros blogues. Mas também, aqueles que nunca tiverem sido publicados em algum blogue. Os que nos cheguem através da caixa de correio.
Todos os outros posts serão pura e simplesmente, eliminados.
Não editados.

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