<$BlogRSDUrl$>
Comente, p.f.:

terça-feira, setembro 23, 2003

61. Embora seja preciso fazer balanço para ler "Ciúme", esta longa entrada do Levante, compensará pela forma como o autor discute a questão do sentimento de integração que, virtualmente, a Blogosfera concede aos seus participantes.

Ciúmes
Sinto que ainda não me consegui integrar no universo dos blogues. Tal facto deve-se menos à falta de tempo para actualizar o meu pedacinho de exposição cibernáutica do que a um conjunto de dúvidas e preconceitos que tenho tentado identificar.
Talvez fosse importante perguntar-me pelo grau de justeza da palavra integrar. O que significará aqui, neste espaço (sem espaço?), uma tentativa de integração? Será esta necessária e inevitável?
Não consigo deixar de adoptar um certo cepticismo em relação às novas formas de comunicação que se vão construindo, articulando por aí. Vício filosófico, porventura, incapacidade de lidar com o reino do virtual (o único "real" que existe) que toda a filosofia, temerosa e periclitante, não consegue admitir - porque aí se joga a perda de fundamentos, a dispersão dos rostos e a disseminação dos conceitos. Será isto? Seria isto que o Quim, fora do seu ar e sob outros ventos, face a face, realmente me tentava dizer.
Talvez, mas até aí tudo bem, até aí concedo a minha fraqueza, esta tendência para a posse e a reunião, este medo de me deixar perder no escuro de uma casa sem alicerces. Mas a (minha) filosofia, e aqui começo a discordar, não é nostálgica, é ciumenta. Não pretende recuperar um real que se perdeu nos tentáculos técnico-científicos do cartesianismo (a internet e a blogosfera são alguns desses tentáculos, nascidos do método, da aplicação técnica dos conhecimentos, do conjunto de instalações e aparelhos que surgem encadeados orgânica e "naturalmente" no mundo. É interessante verificar como a certeza científica e a sua aplicação técnica foram capazes de produzir e encadear produtos que destroem os fundamentos dessa certeza e aplicação), quer antes a posse da dispersão para, enfim, a reunir até ao limite do possível. Sabermo-nos tocados pelo limite é afinal o mais difícil (merda, estou cheio de Derrida!).
Nas Meditações sobre Filosofia Primeira Descartes procurava, entre outras coisas, verificar a concordância entre as imagens que o homem possui no seu interior e a realidade que está lá fora, no exterior. Com brilhantes artifícios o filósofo alcança o seu objectivo e acerca-se da tão afamada certeza cartesiana. Esta clássica questão da filosofia do conhecimento, que Descartes colocou sob um novo prisma, enraizou-se de uma forma tão profunda na nossa cultura que é hoje difícil deixarmos de falar numa realidade exterior. Aparentemente, ela existe: o som que ouço corresponde ao carro que passa lá fora, fecho os olhos e tenho a certeza de um monitor com a página do blogger à minha frente, a televisão dá-nos constantemente a distância do mundo que existe (e daqui de abrem as fobias da manipulação televisiva). Sempre lá fora, no exterior de nós. Mas eis que, na própria filosofia e nos mais diversos campos da cultura ocidental (aquela que mais se preocupa com estas questões de concordância, já que outras culturas pura e simplesmente vivem as coisas...) as rupturas começam a acontecer. E se os alicerces da nossa casa estivessem assentes na subjectividade e na insegurança? E se tudo não passasse de uma ilusão? A pouco a pouco vemos que aquilo que nos rodeia não passa de uma complexa construção, móvel, sem um ponto fixo; um “pós-moderno” reino do virtual - expressão que odeio usar mas que, neste caso específico, parece preencher o espaço aberto pela ideia.
Mas como relacionar isto com o meu problema de integração?
Nem tudo é virtual e volátil neste reino. Aparentemente a integração deveria ser fácil, sem barreiras. Os blogues são das formas de expressão mais democráticas e livres do planeta. Só deveriam ser necessários uma forma de acesso à internet e algo para escrever. O resto seriam construções de teóricos. No entanto, a verdade é que as construções são próprias dos sistemas ditos virtuais e sem centro real. E estas construções são aglutinadoras e têm tendência a basear-se em centros de reunião e distribuição. Não sei se é isto que está a acontecer com a blogosfera, mas acho que não podemos negar o poder das relações no seu interior, pois só assim consigo perceber as minhas reticências. Se a blogosfera não é absolutamente virtual e aberta, tal não se deve ao facto de sabermos existir alguém por detrás dos posts (e dessa forma sentirmos um elemento real), mas à simples constatação de que há laços reais, na sua maioria involuntários e inconscientes: ideológicos, regionais, profissionais, temáticos. Não me quero integrar, quero des-integrar, pois é aí, na nudez dos laços, que está o corpo impuro desta forma de comunicação. E eu adoro o desafio de dissecar corpos pecadores, mesmo quando estou errado e acabo por esquartejar anjos.
Não sou nostálgico, não quero o real, quero os laços e as relações que parecem flutuar no ar.
Ao escrevermos estamos já a reunir, a querer a posse, a evitar a fuga. Escrever: o ciúme.

Autor: NFS
Local: Levante
Data: 18 de Setembro de 2003
Comente, p.f.:
60. Mais um metablogue trazido por Ferran Moreno Lanza, de un que passava, desta vez recolhido em Desde mi ventana, uma entrada em que a autora, a partir de um problema no seu template, reflexiona sobre a sua relação com o seu blogue:

Cuando me cargué la plantilla el otro día, me di cuenta de lo importante que se ha convertido esta historia del blog desde aquel día de marzo en que me decidí a escribirlo, espoleada por el ejemplo de Zoldado, el que a veces escribe cartas y Bernardo, el amnésico. Esas fueron las primeras bitácoras que leí después de ver un reportaje sobre el tema en el suplemento La Luna, de El Mundo, y me pareció una idea tan buena que me lancé sin saber muy bien qué iba a contar, ni cómo, ni hasta dónde podía llegar. Cuando han pasado cinco meses desde aquello, reconozco que el rito diario de contar algo es uno de los momentos más gratificantes del día, igual que dar un paseo por las bitácoras amigas, o lanzarme a pescar alguna nueva que merezca en el torbellino siempre en aumento de las debutantes.

¿Y por qué este gustillo por escribir, cuando llevaba años haciendo un diario? Pues sencillamente porque ahora sé que alguien me escucha. Esta ventana no encontró su auténtico sentido hasta el momento en que puse el sistema de comentarios. Ese flujo de ida y vuelta, ese saberse oído, y disfrutado, ese mirar hacia fuera y dejar que los demás también fisguen lo que hay dentro... caray, es de lo mejorcito que existe. Se descubre tanto y tan bueno, que de otro modo, nunca llegaría hasta nosotros... Gente que merece la pena, algunas personas que, poquito a poco, están terminando por convertirse en amigos, y de los de veras. Una vía de doble sentido en la que, sí, puedes encontrarte a kamikazes indeseables, cretinos absolutos y auténticos pirados, pero también descubrir a gente con sentimientos tan auténticos que a veces no puedes evitar el escalofrío. Gente con la que sufres cuando ellos lo hacen, con la que te alegras cuando las cosas les van bien, con la que esperas mordiéndote las uñas cuando andan pendientes de una respuesta importante para sus vidas... Gente que parece que te había estado esperando, porque estaba ahí, ya no lo dudas, para terminar encontrándose contigo...

¡Vaya parrafada “metablogística”! Pero tengo un atenuante: el trauma del template destrozado me ha hecho pensar mucho. (.../...)

Autor:Teresa
Local: Desde mi Ventana
Data: 5 de Setembro de 2003

Comente, p.f.:

segunda-feira, setembro 22, 2003

59. Através de Ferran Moreno Lanza, de un que passava, que assim se estreia como colaborador do Metablogue, chega-nos o primeiro metablogue em lingua castelhana, Bitácoras (um dos termos utilizados para designar os blogues na blogosfera espanhola), recolhido no Blogue Megapixel.

Bitácoras
La primera vez que conocí el término weblog se remonta al 28 de diciembre de 2002... Reconozco que bastante tarde para lo enterado que estaba el mundo de esta nueva forma de comunicarnos, pero en fin, ese día me llegó a mi buzón de correos una historia muy graciosa sobre "la navidad en Venezuela" y pregunté a quien me lo había enviado, la fuente. Esto fue lo que recibí:

"la encontré en una de esas páginas que llaman weblogs, son algo así como diarios personales y llegué a ella por pura serendipitividad."

Lo asimilé como eso: una sencilla información... Al pasar el tiempo, fui consultando más y más diarios personales, preguntándome que ganaría la gente escribiendo.
No existe mayor censura que la autoimpuesta, una bitácora tan solo se resume en una experiencia donde puedes contribuir a que otros internautas aprendan sobre algo que te apasiona, conocer distintos puntos de vista, técnicas que desconocías; en otras palabras, estar en contacto con gente que te visita desde lugares muy lejanos.

¿serán para siempre? Están de moda, y eso no se discute. Google acaba de adquirir el mayor proveedor de bitácoras en la red. Dentro de algunos meses, todos los grandes portales apostarán por este servicio, tal y como ha ocurrido con cuentas de correo, álbumes de fotos o directorios telefónicos.

Y a ti: ¿qué te motivó a abrir tu bitácora? (si la tienes claro está) Me mantuve escéptica a la idea de tener una por cuestiones de tiempo (y no es precisamente que ahora tenga demasiado). También porque necesitaba buscar un tema. Cuando las acciones las hacemos porque están de moda, no tardaremos en abandonarlas...

No creo ser parte del fenómeno de los weblogs, a titulo personal, considero que postear es una forma de exhibicionismo o por el contrario, simples deseos de compartir lo que sabes. Aunque es totalmente opuesto lo que acabo de describir, yo me apunto por creer que estoy aquí, porque quizás haya un estudiante perdido en la web preguntando como diablos se divide una red, o algo similar (deduzco que son intenciones proteccionistas, para que nadie se enfrente a la frustración que supone no encontrar lo que busca)... Me motiva pensar que soy útil, pero no para contar mis dolencias, o mis sentimientos, para eso, será mejor que dejemos el ordenador a un lado. (.../...)

Autor: Mafer
Local: Megapixel
Data:14 de Agosto de 2003

Comente, p.f.:

quarta-feira, setembro 03, 2003

58. No Cruzes Canhoto foi publicada uma nota sobre a contra-blogomania: a moda de ser contra os blogues. O texto intitula-se «Enxovalhanço Merecido?».

Depois da moda dos blogues, seguiu-se inevitavelmente a moda de ser contra os blogues (crédito ao Pedro Rolo Duarte por ser o primeiro). Esta tendência diverte-me e parece-me natural. Vindo principalmente de figuras institucionais, isto é, instaladas confortavelmente no sistema e sem vontade de mudar, estas críticas parecem-me muito bom sinal.
No entanto, nunca se devem afastar as críticas de ânimo leve pois contêm sempre uns pozinhos de verdade (do mesmo modo que nunca devem ser encaradas de modo bíblico).
Os blogues podem ser apenas vistos como uma linha aberta do bitaite, um confessionário público ou uma tertúlia entre amigos e não há nada de mal nisso nem quer dizer que estes blogues sejam maus. Há blogues óptimos a mandar bocas, blogues excelentes a abordar pequenas histórias do quotidiano pessoal e blogues interessantes a conversar com outros blogues.
Mas reduzir os blogues a isto é também condená-los ao efémero e ao grupal.
Os blogues podem ser também um excelente suporte para experiências literárias que à partida os editores nunca publicariam (1, 2, 3, 4) e, o ponto que mais me interessa, podem ser uma nova forma de media.
Fareed Zakaria, da Newsweek, fez a seguinte observação a propósito:

No mundo do jornalismo, a página web pessoal ("blog") foi saudada como o carrasco dos media tradicionais. No entanto tornou-se algo de muito diferente. Longe de substituir jornais e revistas, os melhores blogues -- e os melhores são muito bons -- tornaram-se guias dos media, apontando fontes invulgares e comentando notícias conhecidas. Tornaram-se os novos mediadores para o público informado. E, embora os criadores dos blogues se vejam como democratas radicais, são na realidade uma nova elite de Tocqueville.

Num mundo em que os media estão cada vez mais murdochizados (em Portugal, PTzados), isto é concentrados nas mãos do governo ou de dois ou três ricaços, com todo o défice de liberdade de expressão e ameaça democrática que isso implica, os blogues podem ser uma fonte excepcional de cruzamento e concentração de informação, de exploração de factos menos conhecidos e refutação de notícias dúbias. Em Portugal há, infelizmente, poucos sites deste género, há o Valete Fratres (de direita), os blogues do Paulo Gorjão e mais uns poucos. A maioria são americanos, como o Instapundit (de direita), o Indymedia (de esquerda), o Slashdot (informática), o Newsfilter (bizarro) e muitos outros. São estes dois géneros que tornam os blogues importantes e a ter em conta no futuro. A importância dos blogues notou-se no caso de Raed e agora no caso dos blogues iranianos. Por muitos artigos de jornal que se escrevam a maldizê-los. J

P.S. - As críticas à escrita ou superficialidades dos blogues têm o mesmo valor que as críticas à boçalidade nos telejornais e querem dizer apenas isto: que são medias democratizados e acessíveis a todos e não dão apenas voz a alguns "esclarecidos". O resto são questões socioculturais.

Autor: Os Canhotos
Local: Blogue - Cruzes Canhoto
Data: 2 de Setembro de 2003
Comente, p.f.:

terça-feira, setembro 02, 2003

57. Verne Kopytoff, do San Francisco Chronicle, debruçou-se sobre o fenómeno de «mainstreamização» dos blogues num artigo intitulado «Internet giants catch on to blogs: Major portals provide services for online journals».

Blogs, online diaries kept by people who want to share their thoughts, peeves and lives with others, are an underground phenomenon. Right?

It's a niche world of small Web sites that most people outside the blogging community have no idea exists. Right?

Wrong. Blogging is becoming mainstream.

America Online, the Internet behemoth, began offering blogging to its users in August. At the same time, Yahoo started experimenting with blogs on its Korean Web site and is believed to be considering expanding the service elsewhere in its vast network.

Google and Lycos began offering blogging earlier this year.

"It definitely seems like blogging is losing its underground image," said Matthew Haughey, co- author of the book "We Blog: Publishing Online with Weblogs" and co-founder of Blogroots, a Web site that chronicles blogging news.

"I'm hopeful that it's a good thing that every Tom, Dick and Harry has a blog. "

Analysts say that the big Web portals are trying to capitalize on the growing popularity of blogs, journals that are frequently updated with everything from personal musings to art, poems and photography. Analysts agree that hundreds of thousands if not millions of people have created such Web pages within the past few years.

Reasons to keep blogs vary, but most bloggers say they are simply a way to express themselves, connect with others and work with software.

"I use it as a sociological experiment to see what kinds of things I post will cause people to comment," said Peter Steinauer, a software engineer from San Francisco who keeps the blog, www.swimfinssf.com.

Steinauer's blog touches on everything from trying to get a deck built for his home (none of the contractors he left messages with returned calls) to gay politics (he supports same-sex marriage) to details about his latest dinner (whiskey flank steak, green beans and au gratin potatoes). He said that up to 100 people visit his Web site every day.

The blogging community is still relatively small. Only 2 percent of online households visit a blog site once a week or more, according to a survey released last month by Forrester Research, a market research firm.

In fact, a big portion of the respondents, 79 percent, had never even heard of blogging before the survey.

For the big Web portals, offering blogging software and pages is a way to attract and keep users. The direct financial benefits, however, are limited, analysts say.

"It's a lot of hullabaloo over not a lot of value," said Chris Charron, an analyst for Forrester Research, a market research firm. "That's not to say that blogs don't add value to the people who use them."

The portals have little choice but to offer blogs for free. Charging is difficult because free blogging software is so widely available elsewhere on the Internet.

Advertising is one way to make money. In fact, it appears on blogs created using the software of certain companies, but big advertisers aren't generally interested in blogs, Charron said.

"The quality of these blogs is incredibly variable," Charron said. "It's just not likely to generate a lot of value for an advertiser."

Rick Robinson, vice president for community products at America Online, said his new company's blogging feature, AOL Journals, has about 30,000 registered users so far. It filled a gap in what the Web service offers for personal publishing, he said.

There was no easy way for users to create a Web site on AOL that they could update regularly, Robinson said. At the same time, his company was monitoring the growing popularity of blogging.

What AOL created is a service that it bills as having many uses. Members can create a journal, blog, online column or travelogue, then supplement them with photos and picture albums alongside the text.

"We're trying to be a little more leading edge," Robinson said.

Robinson said AOL realized that its leap into blogging might anger the blogging community, known as an independently minded group. To avoid conflicts, his firm met with many small blog developers and users during the past year.

"We wanted to make sure they knew we were coming into the community but not taking it over," Robinson said.

Google, the popular Internet search engine in Mountain View, got into blogging by buying Pyra Labs, owner of Blogger.com. The value of the acquisition, made in February, was not disclosed.

Google has modestly integrated Blogger.com into its operations. For example, users can place a link to a blog of their choice through the Google tool bar. Google also places ads on blogs created through Blogger.com.

"I think that blogging will be much, much bigger than it is," said Evan Williams, a program manager for Pyra Labs and a co-founder of Blogger.com. "Maybe not everyone in the world will blog, but I think it will become a natural part of the Internet."

Haughey, the author, said that there are two sides to the growth in blogging. It has always been a venue for discussion where bloggers post and then solicit comment from readers.

"There's always a chance that you have wild new perspectives," Haughey said.

He added, "Some of the old bloggers have complained that as the numbers go up, it's hard to find useful blogs."

Asked whether bloggers will have an aversion to using the big portals, Haughey said not necessarily. He said it depends on how good services are, but he added that old-school bloggers value registering their own, catchy Internet domains.

"I think that most old bloggers want myblog.com, not aol.blogs/username."

Autor: Verne Kopytoff
Local: Imprensa - San Francisco Chronicle
Data: 1 de Setembro de 2003
Comente, p.f.:
56. Numa crónica que titulou de Blogue-Notas, publicada hoje no Diário de Notícias, o historiador José Medeiros Ferreira dedica alguma atenção ao mundo dos blogues.

A bloguemania está a difundir-se rapidamente. É, por enquanto, um exercício particular de quem gosta de ter opiniões abundantes e imediatas e revela uma acentuada necessidade de comunicar. A maior parte dos blogues que conheço aparenta-se ao género diarístico da antiga literatura. Um parente dissemelhante e de outra geração. Em todo o caso é um descendente_ À primeira vista é um descendente, em língua portuguesa, de um Miguel Torga menos esculpido em granito lexical, de um Vergílio Ferreira mais mundano na sua conta-corrente, de um Fernando Aires angustiado de metafísica, de um Cristóvão de Aguiar bloguista avant la lettre com a sua relação de bordo existencial. Até me lembrei de Teixeira de Pascoaes e de Raul Brandão, mas os blogues dos nossos cibernautas pouco tratam de sentimentos. Estão mais virados para a descoberta da luta política por conta própria. Porque será? É claro que os blogues não são mais nem menos do que os sites precocemente envelhecidos pela necessidade de criar modas internéticas. Ainda há 50 anos se viravam os fatos do avesso, dando-lhes um retomado colorido, caso o tecido valesse a pena. O site é mais institucional, o blogue é mais individual _ ambos unidos por uma orgia de endereços electrónicos_ Deste modo, e antes que seja tarde, aproveito esta minha curiosidade de férias, para apresentar um modelo de blogue-notas:

Quinta-feira, dia 28: João Cravinho propõe António Guterres como cabeça-de-lista para as europeias. Não é a primeira vez que o faz, mas em Agosto o caso foi mais falado do que nos blogues que reservam uma entrada para Comentários(o). Acho uma boa ideia, embora não faltem excelentes candidatos a cabeças-de- lista para o Parlamento Europeu em quase todos os partidos do sistema, e até fora dele. Depois dos jogadores de futebol deve ser mesmo a melhor especialidade portuguesa. Por isso não me preocupo muito com o assunto. Alguém há-de aparecer. Prevejo um bom resultado do PS e a eleição de pelo menos um deputado do Bloco de Esquerda. Mesmo que o PSD perca essas eleições, com certeza que Durão Barroso não se demitirá. Vou guardar este blogue até Junho do próximo ano para o citar. Posted by José.

Sexta-feira, dia 29: Chuva. Como disse Teixeira de Pascoaes, o Outono em Portugal começa em Agosto. Esta chuva acaba com os incêndios, dirão os patriotas do clima.

Leio uns documentos da Casa Pia n'O Independente. Mas se todos os portugueses fossem avaliados, na indevida altura, por pedo-psiquiatras, quem garantiria o estado da nação no futuro?! E quantos blogues não seriam precisos para revelar as pulsões, as tendências, e até os actos de tanta gente feliz com lágrimas? Freud elaborou uma teoria geral. Em Portugal, pelo menos desde Pina Manique, elaboram-se fichas pessoais. Posted by Heterónimo Ferreira.

Sábado, dia 30: José Sócrates, no Expresso, afirma que António Guterres é o melhor candidato às eleições presidenciais. Pasmo com este afã de candidatar o presidente da Internacional Socialista a todos os cargos imagináveis. Tanto mais que agora ele vai em missão social da ONU junto de Lula da Silva, conforme também me ensina o mesmo semanário. Prevejo que António Guterres aproveitará a primeira ocasião para repetir estar retirado da política doméstica activa. Ainda é muito cedo para «o natural», como notou o E. P. C. A propósito será que o E. P. C. tem um blogue? Posted by Medeiros.

É isso. Um dia que deixe de ter a coluna no DN vou criar um blogue-notas!

Autor: José Medeiros Ferreira
Local: Imprensa - Diário de Notícias
Data: 2 de Setembro de 2003
Comente, p.f.:
55. Francisco José Viegas (Aviz) dedica mais algumas linhas à análise do mundo dos blogues.

O pior que poderia acontecer aos blogs, além de elaborarmos códigos de conduta, seria determo-nos mais tempo do que o necessário nas razões que levam alguns bloggers a «encerrarem actividade». É provável que existam blogs que não resistam ao Verão ou que só existam porque há Verão, e disponibilidade, e vontade de falar. Isso dura enquanto dura. A natureza do blog é profundamente individualista — mesmo quando abriga vários individualismos. Acabam como começam, temos pena ou não, mas sabemos que ressuscitarão por aí, se ressuscitarem. O impulso que leva alguns bloggers a iniciarem actividade é precisamente o mesmo que os leva a «encerrar actividade». Alguns esgotam os seus objectivos. Alguns, outros, cansaram-se, e estão no seu direito. Outros mudam de rosto e não nos apercebemos (sim, sim). Têm uma marca de exibicionismo e de intimidade, de clarividência e de lugar-comum, de banalidade e de excepção. Tudo isso é natural. Que o Pedro, primeiro, tenha querido acabar com o Guerra e Pás e que o outro Pedro quisesse, depois, interromper o Flor de Obsessão é natural — porque as razões até estão lá inscritas (talvez mais no Guerra e Pás). Mas nada disso é dramático. Tudo isso estava escrito e inscrito, como disse.
Prevejo, de facto, que boa parte dos blogs acabem por estes dias, quando acabar o Verão, quando a vida ganhar «outro sentido» ou for necessário «regressar à vidinha». Um blog não é «um meio de comunicação social». O seu carácter flutuante diz-nos que «viver sempre também cansa», que há coisas que nascem da imensa harmonia do mundo, e que há outras que vêm do fundo da tempestade. Não interessa. Temos de ser tolerantes para com a própria natureza do blog, que é essa: existe enquanto existe.
Não sei quando acabará o Aviz. Vou escrevendo, tenho a noção de que escrever num blog é uma coisa precária (não tenho contador, não quero, não caio em tentação, não — claramente, não — acho que um blog tenha «audiência», talvez tirando o Abrupto), que somos voyeurs e objectos de voyeurismo em simultâneo. Mas há coisas que se dizem através dos blogs e há coisas que não digo através dos blogs. O que escrevo noutros lados não me impede de escrever o que escrevo no Aviz, mas não penso muito nisso. Não roubo tempo «ao outro lado» para escrever neste; nem roubo tempo «a este lado» para escrever no outro. Cada coisa — cada suporte — tem a sua natureza, mesmo que não a saiba identificar. No Aviz escrevo sobre a noite, sobre a insónia, sobre a minha fé e as minhas saudades, sobre política, sobre o que quiser, sem me importar com a opinião de Luís Delgado. Não tenho a ideia de uma «utilidade» dos textos; acho que há textos dos blogs que têm dignidade suficiente para serem publicadas em livro, numa revista, numa página de jornal; e há colunas de jornal que nunca deixaria que se publicassem no meu blog, porque nenhum preço paga aquela mediocridade, aqueles erros de gramática ou aquela falta de ideias. O mundo é um mistério, não é?
Acho que é por isso mesmo (por o mundo ser um mistério) que tenho um blog. Discuto com quem quero (e só com quem quero), discuto até onde quero (e só até onde quero), no registo mais «disponível» por que se possa optar. Provavelmente por ser assinado e se tratar de um blog público não é tão confessional como seria um «diário pessoal». Mas mesmo o carácter confessional da escrita, como se diz no Norte, «vai da pessoa». Muitas vezes, o Aviz é um texto único contra a noite, contra a insónia, contra os mosquitos que vêm com o Verão. E vai com a música que estou a ouvir.
Na generalidade, inclusive, penso que há blogs muito interessantes com que aprendi bastante — sobre literatura, sobre filosofia, sobre política. Com outros, irrito-me em silêncio porque prolongam aqui a ignorância que se detecta nas «conversas de circunstância», reproduzindo erros e omissões da imprensa generalista ou da mais alinhada. Mas por isso mesmo defendo a inexistência de qualquer código de conduta senão aquele que deriva do bom- senso — que é uma coisa muito pessoal. Desconfio daqueles que vêm educar as massas e arrebanhar multidões (acho o proselitismo muito discutível). Desconfio ainda mais daqueles que se vêem investidos da missão de «acordar consciências» para pôr toda a gente a discutir e a «debater». Aqui deixamos o que queremos e só somos julgados por isso. Acho bem que existam blogs que citem, citem, citem, que exponham as suas paixões e que escondam os seus amores. Tudo se nota, quando é escrito. Escrever profundamente é mostrar os lugares da paixão (a paixão, a divergência, o ressentimento, o amor, a delicadeza, a tranquilidade), mas só quando se quer. Muitas vezes é só insónia. Só perguntas: e a noite, o que é? — por exemplo.
Fazer de um blog mais do que isso já me parece extravagância.

Autor: Francisco José Viegas
Local: Blogue - Aviz
Data: 28 de Agosto de 2003
Comente, p.f.:
54. Patrícia (Mau Feitio) tece alguns comentários sobre o mundo dos blogues, debruçando-se sobre o que considera ser o pedantismo e o pseudo-intelectualismo de alguns blogues.

Fiz uma viagem mais longa do que o habitual pelos blogs portugueses. Com mais paragens, e também estas mais longas que o costume. Não me apetece procurar adjectivos para descrever o que li. Mas sem qualquer esforço vêm-me à cabeça dois substantivos abstractos: pedantismo e pseudo-intelectualismo.
Muita filosofia de trazer por casa, muito humor «eu sou tão culto que sei fazer piadas com este tema», muitas citações (em várias línguas, porque «claro que sabe francês, se não sabe saia do meu blog, sua amostra da cultura popular!»). E muitos nomes de peso largados aqui e ali, como quem não quer a coisa. Se eu agora disser «Proust» este texto fica logo com outro ar. «Kafka». E já agora, «existencialismo de Sartre e Kierkegaard». Mais uma ou duas e o Mau Feitio já pode constar daquela elite de links que esses blogs têm em comum (devem ser uns cem, que se linkam mutuamente).
E depois quando querem mostrar ao «povo» que no fundo também são pessoas comuns... lá vem a descrição de um dia bem passado, do tipo «entretive-me com a leitura comparada de Oscar Wilde e Bernard Shaw, com a apreciação profunda de uma peça de jazz contemporâneo, um passeio pelos antiquários do Príncipe Real e um bife com ovo a cavalo no Martinho da Arcada, temperado com os fantasmas das antigas tertúlias cujos espíritos em mim se perpetuam.»

Autor: Patrícia
Local: Blogue - Mau Feitio
Data: 19 de Agosto de 2003

This page is powered by Blogger. Isn't yours?